quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Comentário sobre o filme Rain Man (1988) :

Sabemos que a família é o lugar onde nascem e se desenvolvem os seres humanos e que é nela que conferimos nosso suporte emocional, econômico e geográfico (Groissman, 2005)
A família é a unidade básica do ser humano, primeiro laboratório social. Independente das características individuais, mentais e físicas, carregamos seus significados e padrões próprios.
Cada membro familiar exerce sua função no sistema , interagindo de forma a alimentarem e serem alimentados por este sistema. Cada sujeito em interação com outro adquire seu papel na trama familiar.
Desse modo, podemos dizer que qualquer movimento em uma das partes irá repercutir nas demais. Alguns acontecimentos ao longo do ciclo de vida familiar também influenciam nesta dinâmica pois exige de seus membros uma série de adaptações. Esses acontecimentos podem ser desde situações de vida dita “normais”, como : nascimento, morte, fases adolescência, adulto, velhice até as inesperadas situações trágicas, doenças crônicas, falência e etc.
O filme Rain Man aborda uma relação familiar focada na interação de dois irmãos, mas que também trazem resquícios de toda uma dinâmica familiar anterior a esse encontro.
Com a entrada de um filho, seja ele autista ou não, a família precisa organizar-se para esta nova composição. Essa releitura dependerá das características próprias dessa família em lidar com mudanças.
No caso da inserção do membro autista, essa adaptação à mudança é ainda mais necessária, pois exige de cada membro uma nova rotina em prol das necessidades especiais que o autista apresenta.
Sabemos que o autista tem características peculiares, ele por si só apresenta uma grande dificuldade em adaptar-se a ambientes e situações, através de seus comportamentos estereotipados e dificuldade de se colocar no lugar do outro, déficits nos comportamentos de comunicação, socialização e interação.
Essas características peculiares exigem da família uma maior flexibilidade, uma vez que o membro autista é aquele menos capaz de flexibilizar sua rotina. Cabe ressaltar a importância de estar atenta a cristalização de papeis, pois pensando em relação ambas as partes precisam trocar e ceder, mesmo o autista com suas limitações precisa adaptar-se ao mundo desconhecido, cada um com sua contribuição conforme pode.
A troca interacional está presente em todo o enredo do filme, no qual os dois irmãos estão em constante adaptação ao padrão de cada um. Por outro lado, também percebemos uma forma comum de se relacionar expressando um padrão familiar comum aos dois.
Sintomatologicamente os dois se encontram, ambos necessitando aprender a serem mais flexíveis e a dar sua contribuição para o crescimento da família. O irmão mais velho, autista carrega consequências de uma institucionalização longa e aparentemente uma segregação social, pois pouco conviveu com sua família.
Já o mais novo, interpretado por Tom Cruise, também esteve à margem na medida em que resolve afastar-se de sua família em prol das dificuldades no relacionamento com o pai. Este pai também pareceu ser uma pessoa rígida e que de certa forma não dava passagem para seu filho, sempre o submetendo a sua forma de ver as coisas e no final da vida acaba por criar uma situação em que ambos os irmãos teriam de se confrontar, uma RE-LAÇÃO!
Se olharmos de forma ampla, a rigidez está presente em todos os membros, ironicamente o sujeito autista parece ser o mais flexível, denunciando uma estrutura familiar para além de sua síndrome.
O filme nos permite pensar que o diagnóstico é apenas um detalhe entre tantos outros a serem observados, para além da cura do autismo é necessário pensarmos na contribuição de cada membro para relações mais saudáveis e felizes, que não necessariamente irá culminar numa cura do diagnóstico mas talvez de corações.

Nádila Walter da Silva
Psicoterapeuta de Família e pesquisadora do Autismo e as Relações Familiares.

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