sábado, 24 de agosto de 2013

Condição Humana



“Somos previsivelmente irracionais,
supostamente racionais e
surpreendentemente complexos.”
Zélia Nascimento

Diante dos avanços de pensamentos e tecnologias da atualidade, ficamos às vezes na ilusão de que alcançamos algum domínio sobre a vida, que poderemos ser deuses. Acreditamos também que a racionalidade humana utilizada para balizar o mundo nos é confiável e responderemos, através dela,  de maneira capacitada aos inúmeros desafios que aparecem.

No entanto, vivemos, mais do que nos damos conta, no imaginário, no mundo das idéias, dos mitos, da vida com um lado só. E tendemos a reagir de maneira muito rápida e pronta diante dos acontecimentos do mundo, com um crença ainda de que a atitude tomada foi pensada, quando na maior parte das vezes ficou somente justificada.

A vida nos acontece a cada instante, somos provocados e estimulados a todo momento e permanecemos, em uma primeira ocasião – exatos 90 segundos – em um estado de total imersão nas emoções, ou seja, no nosso lado mais instintual, irracional, no qual tudo fica embolado, misturado, ainda confuso. Após esse tempo, temos condições de avaliar, pesar a posição e a oposição que o real nos coloca e escolhermos aquilo que nos é único, que vai ao encontro da nossa subjetividade. Porém, muitas das vezes, começamos a racionalizar o fato, a tentar entendê-lo com uma lógica somente, sujeitos a correr o risco de nos defendermos e acusarmos o mundo. Quando isso ocorre, fazemos na verdade uma trapaça do pensamento. Desse modo, racionalizamos e conseguimos justificar as mais inacreditáveis desculpas, nos inocentando da participação que temos na vida. E ainda acreditamos que utilizamos da nossa racionalidade... mas estamos apenas “tendo razões”!

Contudo, se quisermos realmente viver nesse mundo contraditório, paradoxal, no qual ao mesmo tempo em que somos dependentes, somos também muito autônomos, que ao fazermos o bem, somos capazes de muito mal, ou seja, em que tudo é tecido junto, temos que começar a entender que possuímos um lado instintual que nos rege a maior parte do tempo, pois sempre algo vem ao nosso encontro e mexe em um primeiro momento com todas as nossas emoções. Desse modo, para exercermos a humanidade existente em cada um é preciso esse discernimento, com uma compreensão para além das reações imediatas e também a aceitação de que a realidade é surpreendentemente complexa, assim como o ser humano: é o encontro das contradições, sendo que uma coisa se opõe a outra, mas também a complementa e nos causa surpresas que tanto podem nos fascinar quanto horrorizar. É necessário esforço para viver bem, pois se ficarmos somente naquilo que nos é natural, familiar, no já conhecido, temos a tendência a rejeitar aquilo que na verdade nos salva e a ficar com aquilo que nos prejudica. Desse modo, se queremos ser deuses, somente o poderemos ser em participação, a custa ainda de muito esforço para percebermos a nossa parte animal e com uma atitude de espera ativa para, assim, nos deixar surpreender...

Janine Araujo
Psicóloga do NASS

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Relações Familiares - Irmãos

Autora: Solange Maria Rosset


       Ter irmãos sempre foi uma realidade banal que não se discutia. Hoje, ter filhos, ter só um filho ou vários é uma escolha. Então, a questão da importância ou não de ter irmãos passou a ser avaliada, discutida e trabalhada para colher bons frutos dessa relação.
      O grupo de irmãos – mesmo que só de dois – é o primeiro laboratório social da criança. É o espaço onde se aprende e se treina de forma protegida a negociar, cooperar e competir. Esse treino é muito importante para a vida adulta e engloba descobrir formas “positivas” e  “negativas”  de lidar com essas questões e com os sentimentos ligados à elas. O espaço familiar e entre os irmãos é o local afetivo e seguro para descobrir habilidades e características pessoais e desenvolver estratégias.
       Os irmãos que conseguem realizar esta experiência de forma permissiva e segura podem crescer e se tornar adultos usufruindo do lado bom de ter irmãos e colocando os limites necessários para terem autonomia e privacidade.
       Irmãos adultos funcionais sabem que podem contar um com o outro. Se um precisar de cuidados, de carinho, de presença, de um afago, de um ouvido amigo o outro dará. Se um precisar de limite, de orientação, de aprendizagem, aceitará que o outro lhe dê. As verdades podem ser ditas, o amor pode ser expresso mas também podem calar e respeitar.
     Por outro lado, uma relação fraternal saudável tem distância. Dará espaço para as relação amorosas e conjugais pessoais. Dará espaço para a privacidade, para os segredos, erros e decisões pessoais.
    Se eles treinarem a ter proximidade e distanciamento, afeto e brigas, invasão e respeito, competição, rejeição, perdão, e todas as outras possibilidades de emoções e relações terão aprendido a manterem uma relação afetiva e autônoma como adultos, entre eles e nas suas outras relações.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Comentário sobre o filme Rain Man (1988) :

Sabemos que a família é o lugar onde nascem e se desenvolvem os seres humanos e que é nela que conferimos nosso suporte emocional, econômico e geográfico (Groissman, 2005)
A família é a unidade básica do ser humano, primeiro laboratório social. Independente das características individuais, mentais e físicas, carregamos seus significados e padrões próprios.
Cada membro familiar exerce sua função no sistema , interagindo de forma a alimentarem e serem alimentados por este sistema. Cada sujeito em interação com outro adquire seu papel na trama familiar.
Desse modo, podemos dizer que qualquer movimento em uma das partes irá repercutir nas demais. Alguns acontecimentos ao longo do ciclo de vida familiar também influenciam nesta dinâmica pois exige de seus membros uma série de adaptações. Esses acontecimentos podem ser desde situações de vida dita “normais”, como : nascimento, morte, fases adolescência, adulto, velhice até as inesperadas situações trágicas, doenças crônicas, falência e etc.
O filme Rain Man aborda uma relação familiar focada na interação de dois irmãos, mas que também trazem resquícios de toda uma dinâmica familiar anterior a esse encontro.
Com a entrada de um filho, seja ele autista ou não, a família precisa organizar-se para esta nova composição. Essa releitura dependerá das características próprias dessa família em lidar com mudanças.
No caso da inserção do membro autista, essa adaptação à mudança é ainda mais necessária, pois exige de cada membro uma nova rotina em prol das necessidades especiais que o autista apresenta.
Sabemos que o autista tem características peculiares, ele por si só apresenta uma grande dificuldade em adaptar-se a ambientes e situações, através de seus comportamentos estereotipados e dificuldade de se colocar no lugar do outro, déficits nos comportamentos de comunicação, socialização e interação.
Essas características peculiares exigem da família uma maior flexibilidade, uma vez que o membro autista é aquele menos capaz de flexibilizar sua rotina. Cabe ressaltar a importância de estar atenta a cristalização de papeis, pois pensando em relação ambas as partes precisam trocar e ceder, mesmo o autista com suas limitações precisa adaptar-se ao mundo desconhecido, cada um com sua contribuição conforme pode.
A troca interacional está presente em todo o enredo do filme, no qual os dois irmãos estão em constante adaptação ao padrão de cada um. Por outro lado, também percebemos uma forma comum de se relacionar expressando um padrão familiar comum aos dois.
Sintomatologicamente os dois se encontram, ambos necessitando aprender a serem mais flexíveis e a dar sua contribuição para o crescimento da família. O irmão mais velho, autista carrega consequências de uma institucionalização longa e aparentemente uma segregação social, pois pouco conviveu com sua família.
Já o mais novo, interpretado por Tom Cruise, também esteve à margem na medida em que resolve afastar-se de sua família em prol das dificuldades no relacionamento com o pai. Este pai também pareceu ser uma pessoa rígida e que de certa forma não dava passagem para seu filho, sempre o submetendo a sua forma de ver as coisas e no final da vida acaba por criar uma situação em que ambos os irmãos teriam de se confrontar, uma RE-LAÇÃO!
Se olharmos de forma ampla, a rigidez está presente em todos os membros, ironicamente o sujeito autista parece ser o mais flexível, denunciando uma estrutura familiar para além de sua síndrome.
O filme nos permite pensar que o diagnóstico é apenas um detalhe entre tantos outros a serem observados, para além da cura do autismo é necessário pensarmos na contribuição de cada membro para relações mais saudáveis e felizes, que não necessariamente irá culminar numa cura do diagnóstico mas talvez de corações.

Nádila Walter da Silva
Psicoterapeuta de Família e pesquisadora do Autismo e as Relações Familiares.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Reflexão da Semana

A vida nos exige coragem e flexibilidade, nos colocar como humanos com erros, limites, acertos e potencialidades nos faz deixar o outro, também, ser apenas humanos e que tem, também, seus limites e erros como grandes potencialidades.

Chamo isso de tolerância que não é aceitação( aceitar não é muito fácil) nem submissão ( posição de vitima e dependente do outro) e sim tolerar, tolerar o outro com seu modo de ser, tolerar o que a vida nos dá e fazer o melhor que for possível. Aprender com os erros. Qual é o outro lado da moeda?

“ O ser humano tem o dever de ser feliz. E, para isso, o dever de reconciliar-se com o mundo, lamentando menos, esperando menos, amando mais. AMOR PELO O QUE É. Neste amor vivemos melhor. No amor ao poder vivemos pior." Autor Desconhecido

Reflexão por: Camila Lobato - Terapeuta Sistêmica do NASS